2:00 pm
Estava só, perdeu a noção do tempo umas quatro, ou talvez cinco vezes, não sabia ao certo. O tempo era um tiquetaquear agoniante, tinha uma cadência perfeita, fizera, antes da angústia, música. O mesmo pano de traços finos. Branco. Bordado por sua avó, ganhara de sua mãe, uma lembrança sem cor, compunha a mesma mesa de madeira, que tinha como decoração o mesmo vaso marrom. Barro. Um retrato exato da ausência. Hoje quebrara a rotina, fizera café para dois. Quente. A janela estava aberta, como sempre, entrava vento, sol e alguns sons, por hora indecifráveis, o mundo exterior não se fazia presente, nem em lembranças.
Vestiu-se, como quem vai mais uma vez para um enterro, vestiu-se com saudade, com pesar. Preto. Sentou-se, como quem senta mais uma vez em um concerto, sentou-se ereto, possuía olhos com ar de atenção. Claros. Acordara, como quem acorda mais uma vez em um domingo. Só. Colocou sobre a mesa o seu cinzeiro preferido, como quem coloca mais uma vez uma foto antiga na sua cabeceira. Apoio.
A radiola tocava distante de onde estava sentado, o que não lhe apresentava nenhum problema, gostava de sons amenos e não era do seu gosto trocar as músicas, acreditava que o tempo entre o começo e o fim de cada canção era a parte mais importante da composição, mostrava em quanto tempo a alma do autor levava para se descrever. Logo ele que do tempo não sabia nada. Perdera mais uma vez a noção de que horas eram.
Acendeu um cigarro. O segundo. Em café amargo foi aos poucos se afogando. A cada gole estava mais perto, a cada trago se sentia mais longe. Esperava. Não sabia ao certo por que estava ali, por que permanecia, ou ao menos se pertencia. Não sabia responder seus próprios questionamentos. As dúvidas se apossavam de cada segundo, faziam-se tempo. Acendeu um cigarro.
Perdia-se cada vez mais em sua própria realidade. Respirou fundo. A necessidade de encher-se de algo real. Silêncio. É a quarta vez que a radiola quebra esse mês. Vazio desproporcional, instrumental, diminuto. E nesse momento fez-se um só com o tempo, fez suas pazes. Tragava do seu cigarro como quem traga vida, calor aconchegante, acolhedor. Tudo que não era veio a ser.
Prometeu, ao próprio Chronos que não passaria ali nem mais um segundo. Acendeu um cigarro. Viu-se preso ao que fora seu apoio. Bateu a cinza. E em seu cemitério apagara mais um minuto. Perdeu-se novamente no tempo. E quem outrora prometeu não passar nem mais um segundo, passou mais um café. Amargo.
3:00 pm
João Gabriel Gomes: autor baiano da novíssima geração, amante da poesia, da filosofia, da arte e de tudo que se esconde no mistério humano, é também estudante de Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais.
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