Muitos diretores possuem assinaturas únicas que distinguem seus filmes dos outros. Neill Blomkamp é um deles, autor e diretor de três longas-metragens, obras que sempre envolvem sociedades com uma certa qualidade e evolução tecnológica, mas grandes problemas sociais.
Foi assim em Distrito 9 (trailer oficial abaixo), seu primeiro longa – e indubitavelmente seu melhor trabalho. Esses fatores se repetem em Elysium e Chappie, porém sem o mesmo sucesso do seu trabalho inicial. Ainda assim, são perceptíveis determinados pontos em comum entre os filmes: principalmente o foco principal de Blomkamp e alvo de suas maiores críticas – as grandes corporações mundiais.
Vê-se isso em Distrito 9, com a clara crítica a uma empresa que toma conta de toda a situação alienígena, tendo como único interesse descobrir uma forma de usar as armas extraterrestres para comercializá-las. Retoma-se o tema em Elysium, onde uma parte abastada da população tem direito a viver em “paraíso” – habitat artificial onde qualquer doença poderia ser curada em instantes. E, por último, em Chappie, onde mais uma vez uma empresa bélica tem suas ações questionadas.
Se a qualidade de seus filmes caiu com o passar do tempo, a forma de abordar temas sociais complicados – e muito presentes hoje em dia – manteve-se adequada e bem conduzida. De qualquer forma, é possível que o melhor exemplo venha mesmo de seu grande filme, no qual ocorre uma espécie de apartheid entre os aliens e os humanos. Vemos o povo sul-africano – sim, o mesmo povo que sofreu o real apartheid – tratar os aliens da forma pela qual foram tratados pelo governo de minoria branca por quase cinquenta anos.
Esse roteiro quase sarcástico tem grandes raízes na nacionalidade de Neill, sul-africano de Johannesburgo. Todavia, meu ponto de vista é que depois de todo aquele sofrimento pelo qual a população passou e tudo o mais que havia ocorrido, espera-se que as coisas tomem rumos diferentes no caso de uma situação similar.
A crítica moral presente no filme, aliada à questão da tecnologia, é o que me leva a crer que no filme habita o cyberpunk. Entretanto, um cyberpunk pertencente ao diretor, algo como um “cyberpunk Blomkampiano”. E com características marcantes, além das supracitadas.
Há sempre um fator de mudança presente nos seus três protagonistas, algo que literalmente começa de dentro para fora. Seja com o uso de tecnologia, alien ou humana, os três passam por transformações corporais que alteram suas vidas do presente momento até o fim. E, nos três casos, são mudanças que os afastam da sociedade e de sua mortalidade.
Outra característica é que muitos personagens – normalmente simbolizando alguma figura de poder ou qualquer funcionário das empresas – são quase que arquétipos dos pecados capitais representados na bíblia: seja a ira do coronel em Distrito 9, a luxúria do personagem de Jodie Foster em Elysium ou a inveja que o personagem de Hugh Jackman tem do sucesso da criação dos “Guardas” de Deon Wilson – interpretado por Dev Patel.
Sendo assim, Blomkamp tem uma obra concisa que aborda temas importantes. Mesmo possuindo discrepâncias de qualidade em seus filmes, as questões expostas por ele fazem seus trabalhos terem um valor extra, que pode nos levar a vê-los e a refletir um pouco sobre nós mesmos e a sociedade em que vivemos.
Rodrigo Maracajá: radicado em João Pessoa, é um dos autores da novíssima geração, crítico de cinema, estudante de Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais, desbravador da literatura e apaixonado por música e HQs.
E-mail: rdrslv97@gmail.com