– Eles fazem botões e sabão conosco.

– O que está dizendo?

– Eles nos queimam no forno.

– Quem disse isso?

– Um homem que estava chorando, ele disse que vamos virar botões e sabão.

– Giosué. Qual é! Você caiu nessa?

 

Se você estivesse em um campo de concentração com seu filho, como explicaria a situação para ele? Suponho que o mais simples seria falar a verdade. Mas não é o caso de Guido, personagem principal de A Vida é Bela (dirigido por Roberto Benigni, que também atua como Guido).

Ao se ver nessa situação, acompanhado de seu filho Giosué, ele prefere dizer que tudo isso não é nada além de um jogo que ele havia preparado para comemorar o aniversário de seu rebento. Eles devem fazer mil pontos para terem direito a ganhar um tanque de guerra novinho em folha.

Antes desses acontecimentos, acompanhamos um pouco da história de Guido. Recém-chegado em Roma, ele se apaixona por uma professora, de nome Dora. Após alguns encontros ao acaso pela cidade – um mais engraçado que o outro –, descobrimos que sua amada já está noiva de um desafeto de Guido. Frise-se que ele cria meio sem querer esse suposto adversário, como muitas coisas de sua vida.

A primeira parte do longa é uma grande comédia – que certamente lembrará a qualidade das comédias all’italiana dos anos 60 e deve arrancar muitas risadas do telespectador. As piadas de Guido são sempre muito espirituosas e contêm críticas veladas.

Em dado momento, ele e seu filho estão em frente à vitrine de uma padaria, a qual possui uma placa: “proibida a entrada de judeus e cachorros”. Ao ser questionado pelo seu filho, ele fala que “cada um faz o que quer”. E, caso ele deseje, pode proibir a entrada de alguém em sua livraria. Então pergunta ao filho se algo o desagrada, e o menino responde que não gosta de aranhas. “Bom, então amanhã colocaremos uma placa: ‘proibida a entrada de aranha e visigodos.’”

Todo esse humor só serve para nos deixar mais ansiosos, já que sabemos o que se sucederá a qualquer momento. Porém, mesmo quando nos vemos cercado de todo o horror do Holocausto, o personagem de Benigni sempre se encarrega de elevar o humor da cena. Justamente nesse ponto, estão presentes muitas das críticas negativas ao filme. A realidade dos campos de concentração é muito relativizada e até fantasiosa.

Todavia, para mim, esse é o objetivo do filme. O que vemos é a saga de um pai para esconder a dura realidade de seu filho. Ele prefere criar toda uma ficção apenas para manter intacta a inocência de seu filho.

A Vida é Bela apresenta um recorte único para uma das maiores tragédias que o mundo já vivenciou. Assim como O Pianista ou A lista de Schindler, é um filme que deve ser visto por todos aqueles que desejam conhecer um pouco mais sobre a 2ª guerra mundial, ou mais especificamente sobre o Holocausto.

Rodrigo Maracajá: radicado em João Pessoa, é um dos autores da novíssima geração, crítico de cinema, estudante de Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais, desbravador da literatura e apaixonado por música e HQs.

E-mail: rdrslv97@gmail.com