O espaço dedicado aos comentários ao final de um texto, uma matéria jornalística ou uma postagem nas redes sociais parece ser um convite irrecusável para os comentaristas de plantão, que agem como se alguém estivesse do outro lado da tela apenas aguardando para ler suas opiniões sobre o assunto. Dê ao homem uma faca e ele precisará cortar alguma coisa. Dê a ele um espaço para comentar, que ele certamente dirá alguma coisa.
Nenhum problema com relação a isso, já que a proposta é justamente dar voz às pessoas e fomentar o debate, o que, muitas vezes, gera resultados bastante positivos. O que quero expor aqui, com base em minha opinião própria, pois deram-me a folha em branco e eu certamente escreverei alguma coisa, é que muitas dessas vozes, de dedos alucinados sobre teclados espalhados pelo mundo, soam altas demais, agressivas demais, impositivas demais. Isto não é exclusividade do mundo virtual, mas acredito que seja uma atitude favorecida e exacerbada neste meio.
Escondidos atrás do anonimato, muitos destes comentaristas tornam-se ferozes, prepotentes e hostis. São as bocas sem rostos que gritam, sem que se identifique de onde veio o som. Mas, é importante dizer que aqueles que se utilizam do anonimato para ofender e difamar o próximo não só burlam os princípios da educação, moral e da decência como também infringem uma lei penal, prevista na Constituição Federal. De acordo com o artigo 5º, inciso IV, “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, ou seja, é imperativa a identificação para que sejam devidamente responsabilizados aqueles que desrespeitarem a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, representadas constitucionalmente no Inciso X deste mesmo artigo.
Porém, não são apenas os anônimos que se sentem livres e até motivados a opinar de forma ofensiva diante da tela do computador ou do smartphone. Causa-me ainda mais espanto quando os comentários são identificados e, muitas vezes, escritos por amigos e familiares, que se sentem estranhamente protegidos no ambiente virtual e dotados de uma coragem que seria impensável se o debate ocorresse face a face, em um almoço em família ou em um encontro fortuito pela rua. Coloquemos agressor e agredido frente a frente e o discurso, provavelmente, será bem outro.
Vozes, assinadas ou não, parecem ganhar uma espécie de passe para a agressão porque talvez o soco seja virtual ou talvez porque, abduzidas pelos megabytes, as pessoas acreditem terem se tornado avatares sádicos, acima da lei, da moral e da ética.
Fernanda Caleffi Barbetta: nascida na cidade de São Paulo, é formada em Jornalismo e pós-graduada em Comunicação Social, tendo publicado os romances Futuros Roubados e Passados Revelados (2017/2018), a coletânea de contos 30 Textos para Descontrair (2019) e o livro de poesias Já não me cabem as rimas (2020); em 2021, lança o livro de microcontos Iceberg, na coleção III do Mulherio das Letras, 2022; mantém o site "Entre Versos e Prosas" (www.entreversoseprosas.com.br) e faz parte dos coletivos "As Contistas" e "Trupe da Escrita".
E-mail: fcaleffibarbetta@gmail.com