Em memória de meu amigo Ismael Diniz, fã do som das guitarras

Acho que já disse, em mais de uma oportunidade, e aqui torno a repetir: a música é feita de rótulos. Entre os inúmeros estilos batizados nas últimas décadas, há o fusion, ou jazz fusion, que agrega várias vertentes, ou termina por ser uma miscelânea de vários universos musicais como jazz, blues, funk, rock, ritmos latinos, country, entre outros. Dizzy Gillespie, Charlie Parker e Miles Davis, três gênios absolutos, foram alguns de seus precursores. Entretanto, o fusion não se restringiu apenas aos instrumentos de sopro.

Houve uma evolução natural do estilo, que chegou ao piano, teclado, bateria, baixo elétrico. Especialmente, no que diz respeito à guitarra elétrica, um dos grandes nomes nas últimas décadas, sem sombra de dúvida, é o texano Eric Johnson (1954 -), músico que possui uma sonoridade muito particular, rica em timbres inusitados com eficientes frases melódicas.

Sua habilidade no piano também o ajudou a construir temas belíssimos, como se este instrumento fosse muitas vezes o complemento ou a extensão de sua guitarra elétrica. Eric é um guitarrista com uma das palhetadas mais limpas que se pode ouvir, utilizando uma abordagem de escalas diferente da maioria de seus colegas, com constantes saltos de cordas, o que lhe dá uma sonoridade muito especial. Não foi à toa que músicos tarimbados como Joe Satriani e Steve Vai fizeram questão de incluir Eric em seu projeto G3.

Muito estilo, personalidade e bom gosto estão presentes em seus temas, tais como Cliffs of Dover, Manhattan, S.R.V. (homenagem à lenda Stevie Ray Vaughan), Zap, Trademark, Camel’s Night Out, 12 to 12 Vibe, entre muitas outras, onde nem sempre a distorção exagerada da guitarra dita a tônica. De quebra, ainda há várias canções em que Eric dá o ar de sua graça com seus vocais, sendo esta, a meu ver, a parte mais kitsch de sua trajetória musical.    

Abaixo, para ilustrar a maravilhosa técnica e feeling desse grande músico, podemos ouvir um de belos temas, cuja composição também é uma fantástica homenagem, nos timbres, na harmonia e na melodia coloridos, a outro guitarrista fenomenal da história do jazz, Wes Montgomery (1923-1968, foto acima). As imagens não negam a abordagem dinâmica que Eric utiliza ao longo do braço da guitarra.

Abro aqui apenas um pequeno parêntesis para viajar um pouco nesse som… Qual seria o outro lado desse mito do jazz Wes Montgomery? Que labirinto nos conduziria à sua faceta harmônica e melódica oculta? Onde estaria o leste de Wes, que o tornaria, talvez, mais denso do que ele realmente foi? É esse outro gênio das cordas – Eric Johnson – quem nos dá uma pista em seu tema “East Wes”. Esta é uma das mais belas “músicas simples sofisticadas” compostas para guitarra. Os indefectíveis acordes de Wes estão nela presentes (com o uso do polegar em vez de palhetadas), ao passo que podemos ouvir um pouco do seu provável e mágico “east”! Timbre sublime em um portentoso tributo do discípulo Eric ao mestre Wes.

Thiago Andrade Macedo: escritor infiltrado no serviço público federal, advogado não militante, autor do romance policial, psicológico e filosófico O Silêncio das Sombras, também atuou como articulista do jornal A União; filho de pernambucanos nascido nas Minas Gerais, atualmente é um ex-nômade radicado em João Pessoa, Paraíba.

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