Quando eu era garoto – não suficientemente pequeno a ponto de não saber o que era sexo, mas insuficientemente grande para fazê-lo – ouvi da boca dos moleques da escola, do mesmo tamanho que eu, que o caracol acasalava – eles disseram transava – só uma vez na vida, mas que essa única e exclusiva durava nada menos do que doze horas. Isso mesmo, uma dúzia, uma volta inteira no relógio.

Eu, que até aquele momento não havia tido sequer um segundo de transa, fiquei alucinado com a possibilidade de meio-dia-inteiro de puro prazer. Trocaria, naquele instante, minhas chances futuras de centenas – milhares, em um cenário mais promissor – de acasalamentos com parcos minutos de duração pelo éden daquele coito – essa palavra vim a conhecer depois – interminável.

A partir daquele dia, enquanto meus amigos faziam investidas furtivas nas gavetas dos irmãos mais velhos à caça das revistas com mulheres nuas, eu passei a visitar bancas de jornal, com os olhares dissimuladamente distraídos sobre as capas das revistas e fascículos dedicados à fauna e à natureza – ainda não existia internet – tentando descobrir ali nas fotografias e nas letras coloridas qualquer outro indício de relação excitante no reino animal.

Hoje, somando várias copulações de alguns minutos em meu currículo sexual, já me conformei com minha sexualidade sem fôlego e desisti da ideia – constrangedora, dado o motivo – de cultivar caracóis em meu quintal. Porém, sempre que passeio em um parque, passo por um jardim ou, em especial, deparo-me com uma horta, espicho os olhinhos curiosos na esperança de encontrar dois caracóis desfrutando de seu (meio) dia de prazer. Infelizmente, nunca aconteceu. Enquanto isso, vou mantendo meus coitos semanais insuficientes e – apesar do advindo da internet – a minha assinatura da National Geographic.

Fernanda Caleffi Barbetta: nascida na cidade de São Paulo, é formada em Jornalismo e pós-graduada em Comunicação Social, tendo publicado os romances Futuros Roubados e Passados Revelados (2017/2018), a coletânea de contos 30 Textos para Descontrair (2019) e o livro de poesias Já não me cabem as rimas (2020); em 2021, lança o livro de microcontos Iceberg, na coleção III do Mulherio das Letras, 2022; mantém o site "Entre Versos e Prosas" (www.entreversoseprosas.com.br) e faz parte dos coletivos "As Contistas" e "Trupe da Escrita".

E-mail: fcaleffibarbetta@gmail.com