You must remember this

 

 

 

 

 

 

 

a kiss is just a kiss…

Não é.

“En un beso, sabrás todo lo que he callado.”

                                                                           Pablo Neruda.

Nunca me esquecerei do impacto ante o beijo de Burt Lancaster e Debora Kerr em “A um passo da Eternidade”, 1953, o turbilhão do desejo exaltado  pela rebentação da onda:

Nunca me esquecerei do beijo mais significativo do cinema paraibano. De Sávio Rolim e Fátima Rolim Almeida, em “Menino de Engenho”, de Walter Lima Jr.

E não dá pra esquecer o beijo de Lady e o Vagabundo, surpreendidos (e eu também ) – na mesma época de “A um Passo da Eternidade” – ao serem levados ao encontro dos lábios pelo mesmo fio de macarrão.

E o que dizer disto?

Há uma levitação, flutuação em torno desse contato magnífico, como se vê neste Chagall:

Às vezes o beijo acontece mesmo entre estranhos, quando algo definitivo e maravilhoso o justifica, como a notícia de que a Segunda Grande Guerra terminara, conforme este flagra de Alfred Eisenstaedt:

Antes de tudo, beijo é vida. Como foi acentuado em “A Bela Adormecida”…

… Branca de Neve…

… na lenda alemã de Siegfried e da Valquíria Brunhilda…

… e – drasticamente dramatizado – na foto ganhadora do Pullitzer de 1968, Kiss of life, de Rocco Morabito, em que o aprendiz de uma companhia elétrica usa respiração boca-a-boca pra salvar a vida do colega que recebera forte descarga elétrica.

Mas as imagens abaixo, de uma escultura dos anos 30, de Jaume Barba, que repete tradições medievais, lembram, com força, a eclosão da AIDS,  quando o amor passou a trazer Morte.

E atenção, atenção!!!

Atenção, atenção!!!

Ah, e veja estes dois – abaixo – Paolo e Francesca, segundo Rodin, no momento de sua glória e perdição!

Dante, guiado por Virgílio no Inferno, viu-os na horda de casais abraçados – condenados pelo pecado da luxúria – passando entre as trevas e montanhas, como num tornado. Perguntou-lhes  a causa do castigo. Francesca de Rimini lhe revelou que era casada – por um arranjo do pai – com o bravo mas deformado Giovanni Malatesta, que tinha o belo irmão, Paolo. Aí, um dia…

… esse cunhado leu para ela a história do amor adúltero de Lancelot por Guinevere, mulher do rei Arthur. Quando chegou ao ponto em que o cavaleiro beija a soberana, Paolo também la bocca mi basciò tutto tremante. E o marido assistiu a tudo.

Perigo! Perigo!

Quem não conhece o “Beijo Veneno”, dos paraibanos Antonio Barros e Cecéu, cantado por Ivete Sangalo? Quem não se lembra de Uma Thurman – no papel de Hera Venenosa (Poison Ivy) – tentando matar o companheiro de Batman,  Robin,  com um beijo envenenado?  (“Batman & Robin”, Joel Schumacher 1997).

Outro momento antológico: Michael Keaton e Michelle Pfeiffer no Batman – O retorno (de Tim Burton, 1992), no qual ele recebe um “beijo de gata” da Mulher Gato…

…o que me lembra outra cena notável, de personagem semelhante, em que há o beijo imensamente desejado por Tobey Maguire (de cabeça para baixo) em Kirsten Dunst (Homem-Aranha, Sam Raimi, 2002):

Esses beijos de mascarados me lembram outro: este, revelador, de René Magritte.

Ah, mas o ímpeto vem de longe. Veja estes dois quadros de Fragonard, do rococó francês:

O resultado deixa marcas fortes nos homens , mulheres e nas artes. Saliento esta pintura de Edvard Munch, em que macho e fêmea  praticamente se sugam e se fundem…

… mais esta, famosíssima, icônica, de Klimt, em que a mulher – florindo  – cai de joelhos , entregue ao homem, todo geometria em ouro.

Já Brancusi criou esta obra expressiva, em que o casal é, na verdade, uma única peça, como visto por Platão em “O Banquete” e pelo autor do Pentateuco no Gênesis (2:25), onde se lê: “serão uma só carne”.

Mas tudo – intuição, descoberta, antegozo e muito de galinhagem  – fica explicita e implicitamente colocado por este clássico “Eros e Psiquê”, de Antonio Canova, como descobrimos rodeando seu incitante e delicado mármore:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Oh, mas existe a Morte!…

… e ela me traz de volta ao cinema. Bem, os idiomas costumam trocar os gêneros das coisas. Água e árvore, em espanhol, são El água e El árbol. O mar, em francês é La mer. A lua é masculina e o sol feminino, para os alemães: Der Mond e Die Sonne. Assim é que no “Sétimo Selo”, de Bergman, a Morte (Der Tod)  é esse cara de negro, jogando xadrez com Max Von Sydow.

A língua inglesa segue a alemã. Assim, no filme “O Encontro Marcado”, de Martin Brest, 1998, Brad Pitt é a Morte. Ele vem buscar o personagem madurão de Anthony Hopkins, mas se deslumbra pela filha dele, Claire Forlani. E a fascinação é recíproca.

Aí se dá que, pela primeira vez, a Morte sente o que é o beijo de uma mulher…

 

 

 

 

 

 

 

… e descobre que a kiss is NOT just a kiss….

PS – O grande (amigo, poeta, ensaísta, tradutor) Ivo Barroso reclama meu silêncio, aqui, a respeito da grande cena do balcão, do Cyrano de Bergerac, de Edmond Rostand, em que o herói de nariz disforme, escondido, leva – com o poder sedutor da palavra – sua amada a dar o primeiro beijo no belo rival dele, Cyrano, magnificamente interpretado por Depardieu na adaptação da peça para o cinema:

PS II – Outro amigo, o homem de teatro Elpídio Navarro, reclama a existência de outra lacuna: eu não disse nada sobre o beijo roubado. Como nunca roubei nada, nem ao menos isso, faltando-me, portanto, experiência da coisa, segue, abaixo, o depoimento de alguém que parece entender do riscado:

W. J. Solha: romancista, poeta e ensaísta paulista radicado na Paraíba, é também dramaturgo, ator, artista plástico e publicitário, com vários livros publicados e premiados, transitando em várias frentes de nossa cultura; um artista "multimídia" por excelência.

E-mail: waldemarsolha@gmail.com