Ok, vocês irão pensar e depois perguntar: por que cargas d’água uma banda de rock meio caipira, do sul dos Estados Unidos, veio figurar em um site brasileiro de cultura? A revolução musical (e comercial) operada pelo rock and roll na música pop é um fenômeno cultural, antropológico, linguístico e semiótico presente no mundo contemporâneo. Pode-se até torcer o nariz para a sonoridade – de fato há muita gente que odeia o imperialismo cultural do Tio Sam -, mas não se pode omitir a carga comportamental que esse estilo de música (para alguns, estilo de vida) despejou em jovens do mundo inteiro, principalmente nas décadas de 50, 60 e 70.

Há roqueiros chatos, que se levam a sério demais e acham que podem estancar guerras e promover a paz com suas letras provocativas e apresentações presunçosamente inspiradas (não darei um doce a quem se lembrou de Bono Vox: meu estoque irá acabar rapidamente). Formada em Huston, Texas, no ano de 1969, a banda norte-americana ZZ Top definitivamente não entra nesse rol de roqueiros insuportáveis: é uma das poucas que encara o verdadeiro espírito despretensioso e zombeteiro do rock and roll.

Nunca estiveram nem aí para salvar o mundo: só querem se divertir e ganhar dinheiro (por que não?). Visualmente, o grupo é uma grande “tirada de onda”: Billy Gibbons (guitarra) e Dusty Hill (baixo) cultivam barbas gigantescas e usam óculos escuros quase todo o tempo, ao passo que Frank Beard (“beard” em inglês significa barba), seguindo a trilha do “nonsense” do conjunto, usa apenas um discreto bigode aparado.

Misturando blues-rock com o velho southern rock, em que se sobressai a guitarra cheia de pegada e estilo de Gibbons, eles mantêm a formação original há quase cinquenta anos. Com letras satíricas e bem-humoradas ambientadas no Texas, sobre festas, bebedeiras, confusões e mulheres, a banda esbanja longevidade, tem uma sonoridade marcante, com os pés fincados no blues, e é dona de clássicos absolutos como “La Grange”, “Tush”, “Beer drinkers & hell raisers”, “Cheap sunglasses”, “Jesus just left Chicago”, “I thank you” (cover da canção de Sam & Dave), “Give me all your lovin” (vídeo abaixo),“Legs”,“Doubleback”(da trilha sonora do filme “De volta para o futuro III”), “Sharp dressed man” (em cujo videoclip aparece a figura do “mascote” da banda, um turbinado Hot Rod Ford Coupé de 1933, apelidado de “The Eliminator” – em dois vídeos abaixo), entre outras. É inevitável a associação: o som da banda lembra pubs lotados de gente com jaquetas de couro, fumando muito cigarro e bebendo cerveja barata ou um velho bourbon.

Com mais de cinquenta milhões de discos vendidos em todo o mundo e um dos ícones musicais dos anos 70/80, o ZZ Top não é exatamente uma banda sobre a qual se elabore uma longa resenha: sua preocupação principal é realmente divertir. Portanto, mais interessante é ouvir a sua sonoridade simples, básica e contagiante, que não deixa de ser também elegante e eficiente. Todo cuidado é pouco, porém, ao ouvir o som classudo e inebriante do impagável trio texano: em meio a uma grande bebedeira, você pode inadvertidamente cruzar o Texas e acordar dopado e desmemoriado, em alguma espelunca do outro lado da fronteira, no México…

Thiago Andrade Macedo: escritor infiltrado no serviço público federal, advogado não militante, autor do romance policial, psicológico e filosófico O Silêncio das Sombras, também atuou como articulista do jornal A União; filho de pernambucanos nascido nas Minas Gerais, atualmente é um ex-nômade radicado em João Pessoa, Paraíba.

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